quinta-feira, 28 de julho de 2016

Um silêncio ensurdecedor

          Nos anos 70, Marina Abramovic viveu uma intensa história de amor com Ulay. Durante 5 anos viveram num furgão realizando todo tipo de performances. Quando sentiram que a relação já não valia aos dois, decidiram percorrer a Grande Muralha da China; cada um começou a caminhar de um lado, para se encontrarem no meio, dar um último grande abraço um no outro, e nunca mais se ver.

               23 anos depois, em 2010, quando Marina já era uma artista consagrada, o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque dedicou uma retrospectiva a sua obra. Nessa retrospectiva, Marina compartilhava um minuto de silêncio com cada estranho que sentasse a sua frente. E o Ulay chegou sem que ela soubesse...


              Esse vídeo sempre volta.  Gosto de silêncios. E esse é um dos meus silêncios mais intensos. Não o dela com ele, cheio de cumplicidade, mas o que veio depois. Quando ela está sozinha de novo de olhos fechados. Brigando para voltar. Brigando com o desejo que ele ainda estivesse ali quando ela abrisse os olhos.


quarta-feira, 27 de julho de 2016

Bonjour

         Houve um tempo em que tudo fazia sentido quando eram 3 horas da manhã e eu estava esbarrando em respostas pra perguntas que eu nem sabia formular direito.

             Houve um tempo em que eu não sentia pena de mim mesmo.

          Acordei num sobresalto 3 e meia. Não consigo lembrar que horas fui dormir. Meu dente dói, mas não é uma dor física. O que dói de verdade é minha negligência. Em tudo. 

            Levanto da cama com raiva. Um banho no escuro. ¿Onde terá ido parar a aranha que morava no meu banheiro.? Cozinha e o mesmo ritual de sempre. Coloca água pra esquentar enquanto faz fogo no fogão a lenha pros meus pais acordarem e a cozinha estar quente. Vai lá fora cuspir a água fria do chimarrão. Chuva. Grama gelada. Talvez eu devesse mesmo não fazer isso descalço. 

              O amanhecer cinza me encanta. Vontade de chorar. ¿Melancolia ou saudade? Às vezes o amor não dá certo. Acho que o amor não importa mais tanto. O chimarrão fica bom. É como puxar água por um canudo. Tudo está bem. 

            Ninguém quer saber das tempestades que encontrei. Tudo que importa é se eu trouxe o navio ou não.

domingo, 24 de julho de 2016

Bienvenue dans ma réalité

         Eu não queria jogar Overwatch, mas um cara de São Paulo comprou o jogo pra mim. E apareceu uma sniper francesa chamada Widowmaker. Com uma aranha tatuada nas costas. 

           E eu jogo com ela só pra ouvir o sotaque francês.



Fico brigando com meu baixo e zaz... me aparece  isso: 


Je veux d'l'amour, d'la joie, de la bonne humeur
C'n'est pas votre argent qui f'ra mon bonheur
Moi j'veux crever la main sur le cœur

Allons ensemble, découvrir ma liberté
Oubliez donc tous vos clichés
Bienvenue dans ma réalité


Eu vejo o que vocês estão fazendo. Muito obrigado.

sexta-feira, 22 de julho de 2016

Cursus ut finem

       Passando na frente da Igreja de São Pelegrino ouvi os sinos soarem como a voz de um velho conhecido. Entendi o recado e entrei na igreja. Às vezes quem está precisando muito de ajuda não consegue enxergar isso por si próprio.

         No altar há uma bíblia velha, cheia de anotações. Subi e peguei ela como se ela fosse minha. Salmo 34. O senhor está perto dos que têm o coração quebrantado e o espírito abatido. No fim eu estava só segurando um livro velho enquanto olhava pro teto. E ria de mim mesmo. Por que é isso que eu faço ali. Fico rindo e chorando enquanto repito pra mim mesmo que tudo isso vai passar. O padre vem e me pede a bíblia dizendo que precisava dela pra rezar a missa. E nós dois sabemos que é mentira, que era só medo que eu a roubasse. Mas era hora de sair. Nunca gostei de missas. Dou um abraço no padre e choro sem dizer uma palavra. Ele me vê sendo comedido faz mais de 20 anos, então acho normal o modo que ele fica surpreso com a minha intensidade. Ele pergunta se eu quero me confessar. E eu solto uma gargalhada sem medo de fazer barulho. Rir enquanto estou chorando: tão nós.

      Saindo pego de volta minha dor e meu desprezo por mim mesmo. Meus cães de guarda não entram em certos lugares. Sento nos degraus e penso em fumar. E decido parar de fumar, com uma exceção. Na minha mão um cartão postal que estava dentro da bíblia do altar. ¿Porque roubar um cartão postal? Porque era preciso um terceiro cartão postal pra fechar o ciclo.

         De tempos em tempo o Diabo vem e coloca o que eu mais quero na minha frente ao preço de uma mentira. E invariavelmente eu não consigo mentir. Chego a pensar que é muita crueldade dele. Uma punição por eu viver no inferno panfletando a favor do paraíso. Mas desde que me entendo por gente O Único Acima faz a mesma coisa: vem e me oferece a paz que eu mereço... também por um preço que eu não posso pagar. Irônico pensar que ambos fazem a mesma coisa por motivos tão diferentes.




Deve ser por causa desse tipo de coisa 

que eu me preocupo tanto

com os motivos das pessoas. 

Principalmente com os meus,


segunda-feira, 18 de julho de 2016

Um urso chamado Bóris

Eu escrevo poesias em carteiras de cigarro
Da mesma forma que escrevia recados 
Em notas amassadas de 2 reais

É meu jeito de ajudar o acaso que tanto venero
Posso ajudar um desconhecido que precisa de um sinal
Da mesma forma que desconhecidos me ajudam

Gosto de pensar que assim mantenho o equilíbrio
É uma mensagem que passa por felizes, tristes,
Negros, brancos, homens, mulheres.

Espero que algum dia, alguém encontre minhas mensagens 
Quando for realmente necessário.



sexta-feira, 8 de julho de 2016

Loucura e amor

         Não que os sinais do mundo tenham silenciado, mas me dei ao luxo de ficar um tempo trancado em casa. A gente nunca é tão vulnerável do que quando está apaixonado e eu paguei o preço por essa vulnerabilidade. Depois do tombo/decepção internacional, achei que podia me sentir insignificante sozinho por uns dias. Mas as ordens de mudança não mudaram e numa bela quinta feira, eu sabia que a mágica estaria em outro lugar.

          Entro num bar que não conheço pra ver no palco um dos reitores da universidade de caráter. Numa troca de olhares estão contidos mais de dez anos de piadas e de uma amizade sincera. Como se a vida não tivesse conseguido tirar de nós a inocência e ainda fossemos só duas crianças burras. Talvez a gente ainda seja. 

           Um cigarro e vejo os cabelos roxos da melhor colega de trabalho. E não deixa de ser engraçado o modo que a gente largou tudo pra se abraçar enquanto ria sem parar. Um riso de euforia pelo encontro e de medo pelo que sabíamos que viria depois. Ato contínuo, estávamos no balcão tomando um shot de jaggermeister. Vários shots. E não existia mais a menor possibilidade de uma festa tranquila. Sim e mais. Loucura e amor. Como se a noite não tivesse conseguido arrancar pedaços valiosos demais de nós dois. Porque segue a esperança de algo melhor. Fígado forte e coração puro. 

           A sensação da bolha, onde tudo fica fácil. Conversas sobre a casa do chá, a Oropa, França e Bahia. E aparece o Barão do Campo Harmônico, porque, ao que parece, a realeza dele funciona bem do lado deste menestrel desafinado. É provável que ele se divirta olhando de fora esse efeito que tenho sobre as pessoas. E a gente toma café de madrugada enquanto toca músicas aleatórias juntos, apenas como pretexto pra poder conversar. E enquanto tocamos melhor, vamos nos tornando pessoas melhores. Acordes e palavras que precisamos saber porque dizemos. Houve épocas em que sentia medo da análise dele nas nossas conversas. Tolice. Agora eu sei que na verdade cada um está ali analisando a si mesmo.

           Esqueci de tanta coisa. Fingi que era outra pessoa pra poder me encaixar. E mesmo encaixado, continuou desconfortável. Aceitei o inaceitável e senti raiva de mim incontáveis vezes. Senti pena das minhas tentativas inúteis de não me sentir inadequado. Fiz muita merda pra me punir. Mas parece que o que afoga a pessoa não é mergulhar e sim ficar tempo demais embaixo dágua. Estoicamente eu sigo. Nadando devagar...respirando ares novos


Nunca sozinho. Nunca impotente.

domingo, 3 de julho de 2016

Mind the Gap

        Texto de Londres, escrito em partes enquanto eu me escondia na sala de uma inglesa maluca e não conseguia dormir..

        Os que tem asas sempre se encontram. Eu tenho um campeonato de ironia com Deus mas de vez em quando a gente declara um armistício. E de repente, a 10000km do que deveria ser minha casa ele manda uma mulher com asas pra me arrancar do fundo do poço e me colocar no caminho a base de rum e rock n'roll. 

         Eu pensei na vela que tinha acendido para um anjo em Sacre Coer, lembrei de como jogo xadrez, de como vivo e vida e de como tudo isso é uma coisa só. E mesmo desmoronando mais rápido do que conseguia me remontar, mesmo tendo vontade de desaparecer, a Maira me encontrou lendo um jornal com a dignidade de um lorde inglês. 

       A vela foi porque eu já sabia o caminho que as coisas estavam seguindo. Não que fosse um plano, mas fica difícil não perceber o que o mundo está dizendo quando ele insiste em gritar na minha cara. Certas coisas são inevitáveis. E ali, tão longe de tudo, foi muito mais fácil ver as coisas em perspectiva..

         E viajamos para longe para descobrir que estávamos com um tesouro na mão quando estávamos em casa. Mas, quer saber.? o tesouro é uma ilusão. A falsa sensação de segurança, de proteção... ela não significa nada pra pessoas que nem eu. 

        Eu lembro da primeira vez que tomei rum na minha vida. E pra sempre vou lembrar de um rum envelhecido que bebi em Londres com gente do mundo inteiro, e que tinha gosto de mal de azheimer engarrafado pelo próprio demônio. 

        É incrível o que as pessoas falam perto de ti quando acham que vc não fala a língua delas. Ainda bem que não conseguimos ler pensamentos.

         Falar inglês é fácil. O problema é ouvir. Porque nunca é aquele inglês que eu estudei no yazigi quando ficava com a professora. É um irlândes, uma espanhola, uma romena ou uma iraniana falando com qualquer sotaque. Ainda bem que malandragem é uma linguagem universal.

         O vale transporte tinha mesmo que se chamar Oyster.? O velho trocadilho da música do Tool. É "peace of mind" or "piece of mind". Whatever.. I saw the gap again today...

Amor sem confiança segue impossível, só pra constar.