domingo, 22 de novembro de 2015

Uma noite auspiciosa

         O pensamento começou a tomar forma enquanto anoitecia. Eu estava numa sacada diferente. Numa cidade diferente. Mas ainda assim me sentia em casa. A metáfora sobre ser como água. Manter o conteúdo enquanto se adapta a forma que se apresenta. Eu voltaria a esse mesmo assunto mais tarde. 

         Festa diferente mas muitos rostos conhecidos. Eu me sentia bem vindo. Todos que trabalhavam comigo: Jeane, Giovane, Marcelo, Rubia, Kiko, Jonas, Leo, Cris, Dani, Fran. Em cada abraço um milhão de histórias, que eu vou resumir na palavra cumplicidade. Não sinto falta do vagão, da noite, dos trâmites. É dessas pessoas que sinto falta. Daquela sensação de pertencer a uma família sem laços sanguíneos, mas com todo o resto.

         De volta ao sentimento de estar em casa. Escorado no balcão encontro o Poletto. Entre outras coisas ele é um baita exemplo de como viver a vida de forma honrada e leve. Aquele cara que seria reitor de uma hipotética universidade de caráter, caso fosse possível ensinar. Um dos caras que eu chamo de amigo com orgulho. Ele conseguiu colocar em palavras o que eu queria dizer desde a sacada e não sabia como "home is a state of mind".

            Depois de tantas pessoas que me fizeram mal, vejo todas essas pessoas boas que permanecem ao meu redor e não fico mais me questionando se mereço ou não. No fim, é só o universo empatando o jogo.  

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Ainda tenho a tua guia.

           Depois de uma madrugada de tendinite pelo meu exagero, ouvindo o som da chuva e contando segundos entre o raio e o trovão, resolvi escrever. Estou sempre escrevendo cartas que nunca vou mandar. Estou sempre querendo ajudar os meus. De alguma forma, acho que ajudando os outros ajudo um pouco a mim mesmo. E entendo um pouco mais meus próprios dilemas. No fundo as pessoas são todas iguais, e as dúvidas tem sido um problema.

           Para explicar o que eu quero dizer, eu poderia falar sobre uma conversa entre Deus e Elias no meio da guera entre Israel e Síria - sim, tem guerras lá desde sempre. Ou poderia contar uma conversa de Exu e Iemanjá no aniversário dela. Mas o fato é que ninguém conseguiu explicar tão bem quanto o Gandalf, falando pro Aragorn e pro Faramir. "O que nos protege do poder total de Sauron não é o fato de estarmos com o  um anel e sim ele não saber onde está o anel. Ele tem dúvidas e o olhar dele fica indo e vindo por toda a terra média, procurando de forma repetida e ineficaz. Quando ele tiver certeza, estando ou não estando em poder do Um anel, nós seremos dizimados."

          Foi esse trecho do livro Senhor dos Anéis que me fez perceber como não se focar faz mal.  Mesmo o Sauron sendo praticamente um X-men, o poder dele era diminuído por ele não poder lutar uma guerra sem dúvidas. O  que nos traz de volta as nossas mensagens. O que tu me falou é uma situação familiar para qualquer um: Existe uma escolha simples e complicada, mas ela é difícil e ficamos adiando. O resultado quase sempre é o mesmo, a falta de ação preserva quem está perto enquanto vai nos corroendo por dentro. Até um ponto insustentável onde a vida nos coloca num ponto onde não há mais escolha e nem lição a ser aprendida. Posso falar pois já passei por isso mais de duma dezena de vezes. 

            Nosso passado não chega nem perto de passar uma ideia de sensatez, mas tu é uma das pessoas mais sensatas que conheço, apesar de ter uma estupidez latente que às vezes atrapalha teu discernimento. Queria que houvesse aqui uma receita mágica para ver o futuro e escolher melhor baseado nas consequências, mas infelizmente não tem. E também não tenho moral nenhuma pra te dar conselhos - e sabemos bem que conselhos no fim do ano tendem a ser o caos instaurado. Pensa bem e que teus pensamentos sejam iluminados para que tu decida o melhor. Vou ficar aqui, sempre pronto pra te ouvir quando ou se tu precisar. E torcendo pelo melhor.

Não porque eu tenho contigo uma dívida impagável, mas sim porque tu é tu.

Fica bem, serenidade e paz.

V.  

sábado, 14 de novembro de 2015

Depois que eu descobri o caminho

          O que você diz de um cara que ganha R$3.400.000,00 num projeto federal e não quer gastar RS100,00 numa diária a mais de hotel pra toda equipe guardar as coisas e poder tomar um banho depois de encerrar a desmontagem da estrutura.? Graças a essa grande economia, a vida na cadeia chegou no nível máximo e acabei por tomar banho numa bica. Agora a única coisa que falta fazer é revesar camas para dormir. Inacreditável.


            Começar uma empreitada nova é bom, mas terminar é melhor ainda. E mais um ciclo que variou entre uma marchada épica e um aprendizado impressionante acabou. Ficam as amizades e a lições que só a estrada e a convivência forçada dão. A vida do baile, basicamente.

            Nesses 4 meses aprendi a ser palhaço. Não usei maquiagem, mas o sorriso que mantive nas crises funcionou como máscara. E no fim, o que define um palhaço é justamente isso: a capacidade de passar uma mensagem de alegria, independente dos problemas e das tragédias do mundo. Conheci lugares que nunca imaginei e pessoas que me surpreenderam nas mais variadas formas. Não poderia usar um adjetivo diferente de "loucos" pra definir as pessoas que trabalharam comigo. Aprendi que conviver é o próprio inferno e que tolerância não é tão fácil na prática quantona teoria. Mas sobrevivemos. E agradeço aqui quem me aguentou na viagem, quem me deu força antes da partida e quem ficou esperando eu voltar.


              E com um anjo e um jasmim a menos, com a bagagem muito mais leve, eu poderia colocar a música do U2 " I still haven't found what I'm looking for" aqui. Mas em vez disso, cito blackbirds. Porque quando o sorriso fraquejava e eu começava a esquecer quem eu sou eu catava um canto sossegado, enfiava um fone de ouvido e abria um livro até voltar pro equilíbrio. E blackbirds foi meu despertador todos os dias da viagem. 

              E se alguém me perguntar como eu volto dessa empreitada de 4 meses, 9 estados, 16 cidades... bom, essa música em especial resume tudo. 



Agora eu volto com ar glacial
Mais forte que nunca, um tanto meio anormal
Um pouco mais vivo, não olho pra trás
quando não sou mais bem-vindo


Talvez eu esteja revirando o fundo,
vivendo meu mundo e seus absurdos
Mas é muito chão para andar então

Vamos lá...

domingo, 1 de novembro de 2015

The orange is the new black


         E chega-se em Anita Garibaldi. Um lugar onde ser gaúcho não significa praticamente nada. Se eu pular um muro estou de volta à República. Cidades pequenas normalmente tem um ou dois hoteís, por isso não cabe muito escolher ou reclamar. O cara do hotel é simpático e me chama de piá. Um sorriso e eu me sinto em casa. Claro que há um Zé Buceta atuando fortemente para que a estadia na cadeia seja ainda pior. Mas é só pensar que faltam apenas duas semanas e nem isso consegue me tirar do prumo.



         Todo mundo tem uma pessoa por perto que está sempre complicando, querendo ter o controle de tudo. Essa pessoa é o Zé Buceta. Sendo insuportavelmente chato enquanto tenta sempre mostrar que é o fodão. Sempre tentando estragar a alegria dos outros. Nada é bom, só o que ele gosta, nada presta, só o que serve pra ele. Se ele é infeliz, todos também tem que ser. Não passa de um bosta. Nessa viagem, eu tenho o meu. E ele pensa que é meu chefe. Não que eu seja especial, ele acha que é o chefe de todo mundo. Não que ele pegue exclusivamente no meu pé. Ele é um idiota com todos, do caixa do mercado ao dono do hotel.

       Meu querido Zé buceta. Não são os artistas que vão colocar no meu rabo quando puderem. É tu e os da tua laia. Mas eu te entendo. A alegria dos outros torna tua inveja e teu rancor muito mais evidentes. E isso te irrita a ponto de tu nem conseguir disfarçar. A lealdade alheia te incomoda porque no teu íntimo tu sabe que ela não te envolve.  Ninguém dá a mínima pra tuas regras e desmandos. E chega a ser engraçado tu falar mal de todos para todos como se ninguém fosse perceber.  Lamento informar, mas tu não tem um rei na barriga e todo mundo tá te vendo cuspir pra cima.  E digo mais, torcendo pra cair de volta em ti.