Podemos chamar de milagre de natal, mas não acordei atrasado. O despertador insistiu muito, mas conseguiu me arrancar da cama. Peguei o Virgílio para conseguir passar algumas músicas e a tendinite me lembrou que o dia ia ser muito longo, tendendo ao infinito. Passagem de som estranha. Foi estranho voltar para um palco. Foi estranho não estar atrás da mesa de som. Demorou, mas deu tudo certo... Não sem a ajuda do Delmar, o apagador oficial de incêndios.
Ironicamente eu percebi que não ia precisar de armadura nenhuma. Eu tinha como me defender. Ironicamente não consegui passar esse natal sozinho ( eu sempre tento, quase nunca consigo). E passar o natal com o Kiko foi engraçado. Quase 4 horas sem que ninguém falasse feliz natal. A coisas indo pro lugar.
Lembro de organizar tempo e fatos pra ajudar todo mundo. Pra encaixar as peças em vez de tocar fogo no circo. O show demorou pra começar. Eu não estava sentindo medo, mas estava me sentindo terrivelmente fora do lugar. Um pai nosso em español e soltei os cabelos, luz na cara e o Giovane anunciando. Não deu mais tempo pra pensar sobre meu lugar ou sobre me defender; sobre quem eu queria que estivesse ali me assistindo. Mandei meu coração calar a boca, por pelo menos 2 horas eu não queria ouvir um idiota me dizendo que falta alguma coisa. Por pelo menos 2 horas eu tinha outras coisas para escutar. Não sei direito se ele ficou quieto, só sei que música atrás de música, nota atrás de note eu fui colocando toda minha energia. Eu prometi que não seria pela metade, que seria tudo de mim em tudo. No fim, avisei que a gente ia tocar mais 4 músicas que a gente sempre quis tocar e nunca conseguiu em banda nenhuma. Aquele era eu tentando explicar sem dizer nada que o ano tinha sito uma merda pra mim e que eu queria um presente de natal foda pra equilibrar a conta. E eu tive o melhor presente de natal que um baixista barulhento e jazzificado poderia querer. Quando o Kiko subiu no palco eu desci pra poder ver melhor. O Barão o Caldo e o Kiko no mesmo palco seria a imagem perfeita para mostrar que meu trabalho estava feito. Se fosse uma frase com a mesma função seria "foi sem querer, mas não muito" no corredor e na confusão entre os banheiros
No meio do show, olhei pro lado e pensei comigo como me sinto estranho em andar com os grandes. Algumas das pessoas mais fantásticas que eu conheço ali tocando juntas e eu de metido. Sabia que no esquema tático minha função era juntar todos eles e manter a máquina funcionando, mas acho que estar num palco tocando não foi invisível o suficiente dessa vez.
Gracias, ao Caldo, porque ele é definitivamente o mestre daquele lado do palco. Ao Barão, por ter mantido um maluco sob controle sempre reiterando que não era musicoterapia. Nick, tenta uns tapas, tu já falou mil vezes e não adiantou. Cla, sem tua produção teria sido inviável. Tchuky, faz uma cuba. Dennis, nunca me deram um litro com tanta competência. Jonas, apesar das cantadas ridículas tu tem potencial. Giovane, tu é foda. Kiko, parceria total. Pedroso, tu é um das melhores pessoas com as quais tenho o prazer de conviver. E eu sempre vou achar um absurdo tu pagar pra eu fazer o que eu faço. Poletto, tinha que ser tu ali junto com a gente. Kiko, se o discípulo perfeito for igual ao mestre, então tenho o professor certo. Potro, Ostra, Dulcinéia, Jasmim, Ana Pic-pic, Mário, Fábio, Ave, Mateus Correria, Copa, Compadre, Bledo, Mark, Wood: vcs não estavam lá, mas tinha um pouco de vcs lá comigo, um pouco de tudo que vcs me ensinaram.
No fim, bem no fim de tudo, acabei o ano fazendo o que eu sempre faço: Um exagero imbecil antes de parar por um tempo. Cansei de viver olhando pro abismo. Cansei de viver com o abismo me olhando. Agora é praia e só.